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CONVERSAS À JANELA - Mariana Cabrita Ferreira - ARQUITETURA




Arquitetura


Hoje, conversámos com a Mariana, que nos fala sobre ARQUITETURA!

A Mariana Cabrita Ferreira é estudante de Arquitetura. Estuda na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto e recentemente fez parte do programa de mobilidade Erasmus+ em Berlim. É natural de Castro Daire, onde passou a sua infância, até se mudar para Viseu, onde completou o ensino secundário no Curso de Artes Visuais, na Escola Secundária Alves Martins. Fez parte da Associação de Estudantes, nomeadamente como presidente, na ESAM, durante o ano letivo 2014/2015 e como membro do Departamento de Relações Externas e Internacionais na FAUP, durante o ano letivo 2018/2019. Fez parte do programa de voluntariado Just a Change, no Porto – um projeto de reabilitação de casas de famílias carenciadas. Paralelamente à Arquitetura, tem realizado trabalhos como ilustradora, tendo já dois livros publicados com ilustrações suas. Vê na área das artes uma oportunidade para se exprimir e comunicar. A Fotografia é para si uma ferramenta que contribui para o seu processo arquitetónico e não uma mera representação.


Mariana, o que te levou a seguir Arquitetura?

Tive consciência, desde muito cedo, que queria seguir uma área que me permitisse criar e comunicar. Sempre fui muito comunicativa e comecei a desenhar muito cedo – os meus pais que o digam… Em casa até nas paredes desenhava. Decidi ser arquiteta no 5º ou 6º ano (na Escola Básica de Mões), quando através da disciplina de EVT, e por incentivo de alguns professores, pude explorar e estimular as minhas capacidades. Penso que alguns professores não têm noção do impacto que têm no nosso percurso, mas eu tive a sorte de ter tido professores que acreditaram sempre nas minhas capacidades e que me permitiram construir uma base para o caminho que tenho feito desde então. Como sou uma pessoa de ideias fixas, construí o meu percurso, a partir desse momento, em função deste objetivo, o de ser arquiteta.


Na tua opinião, para que serve a Arquitetura?

No 3º ano da faculdade, tive uma disciplina, Teoria 2, em que o professor nos questionou sobre “o que é a arquitetura”. Todos nós, uns mais do que outros, mas todos nós, com apenas dois anos a conviver com o que poderia ser a arquitetura, sentimos de repente um aperto no peito por não conseguirmos ser capazes de responder instantaneamente a uma pergunta que parece, a quem vê de fora, de resposta óbvia. Ainda hoje estou à procura da resposta e não sei se alguma vez vou encontrá-la.

Olhando para a pergunta “para que serve a arquitetura”, podemos imediatamente dizer que a arquitetura serve para construir, sem pensar muito na questão. Mas construir o quê, concretamente? Não devemos olhar para arquitetura apenas como algo palpável, mas algo que, de certa forma, nos transcende e nos aumenta, enquanto pessoas. Construímos “espaço” para o(s) outro(s). Construímos “casa” e construímos “abrigo”, construímos cidade e sociedade. E quero acreditar, olhando para uma visão mais romântica da arquitetura, que podemos construir felicidade e todo um leque de sensações e experiências. Vejo na arquitetura uma possibilidade que me fascina, de poder construir para os outros. Poder contribuir para a vida em comunidade e para uma sociedade melhor. Através da arquitetura podemos construir memórias, criar momentos únicos e experiências que moldam a nossa forma de estar. Quer seja no espaço íntimo da casa ou num espaço mais público como um museu ou uma biblioteca.


Que papel pode a Arquitetura exercer no desenvolvimento da sociedade?

Penso que posso relacionar esta questão à anterior, uma vez que, para mim a arquitetura “serve”, também para construir (so)ci(e)dade. Sobretudo, pela situação que estamos a atravessar, cada vez mais é importante refletir sobre a arquitetura e o seu papel na vida em sociedade/comunidade. Depois desta fase de confinamento, é muito importante que reflitamos sobre os espaços e a qualidade dos mesmos. Pensar, por exemplo, a casa como um espaço de lazer e conforto e não apenas como o espaço a que regressamos, cansados, ao fim do dia, para dormir. É também essencial pensar nos espaços como espaços flexíveis que nos permitam adaptar a diferentes contextos. A simples possibilidade de podermos mudar a disposição dos nossos móveis e até paredes – se pensarmos num sistema de paredes de correr e ou/ amovíveis, e o impacto que isso poderá ter no nosso dia-a-dia.

Acho que podemos olhar para a arquitetura não só como uma forma de servir a sociedade, mas também de a organizar, educar… Devemos pensar na arquitetura e no impacto que certos espaços podem ter no nosso dia-a-dia, como podem mudar o nosso estado de espírito e a forma como nos comportamos.


Consideras que a Arquitetura é valorizada nos meios rurais?

Infelizmente não. Há, na minha opinião, um abandono ou esquecimento muito grande da Arquitetura nos meios rurais e vice-versa. Para mim não faz sentido, por exemplo, obras que são consideradas Monumentos Nacionais serem deixadas ao abandono e serem tão pouco divulgadas. Acho que é importante as autarquias terem um papel ativo nestas questões. Assim como em questões de infraestruturas e acessos.

Por outro lado, existe também falta de sensibilidade para o que é a arquitetura no meio rural e qual o papel do arquiteto. Ainda há muitas questões do passado enraizadas. Só no início do século XX a profissão do arquiteto foi reconhecida; antes disso, o arquiteto era visto como mestre de obras e não havia qualquer separação entre a elaboração da “ideia” e a construção. A arquitetura como uma disciplina artística ainda causa algo de cético em muitas pessoas, que interpretam uma obra como algo meramente funcional e técnico. O trabalho do arquiteto não é feito exclusivamente por arquitetos, infelizmente. Principalmente no meio rural, onde, por exemplo, a maioria das habitações/construções tem pouca ou nenhuma intervenção de arquitetos. Durante a segunda metade do século XX os arquitetos em Portugal eram escassos e apesar dessa realidade, em termos numéricos, ser completamente diferente atualmente, penso que se enraizou na mentalidade da nossa sociedade que os arquitetos não são essenciais para uma obra, que o engenheiro ou o construtor pode assumir esse papel. A arquitetura é interdisciplinar, existem diferentes profissões que intervêm nos diferentes momentos da sua elaboração/execução, mas o responsável da obra é o arquiteto. Penso que ainda é preciso haver uma maior consciencialização para a sua prática no meio rural.


Quais são os traços e estilos arquitetónicos que melhor definem o território de Castro Daire?

É sempre difícil responder a este tipo de questões.

Se olharmos para a questão de forma a relacioná-la com o património existente no concelho de Castro Daire, diria que o traço que melhor define a região é caracterizado pelo movimento Barroco, uma vez que houve, no concelho, uma grande expansão nesta época, que se reflete, sobretudo, na arquitetura religiosa.

Existem também vestígios de uma arquitetura castreja, como é exemplo o Castro do Cabeço dos Mouros, em Cabril, e vestígios da romanização. É um concelho muito vasto, no que diz respeito ao seu património.

Por outro lado, se pensarmos no planeamento urbano do território diria que é um pouco disperso e heterogéneo. Estamos, sem dúvida, perante uma arquitetura vernacular. Mas este “vernáculo” é muitas vezes importado de outros países. Há uma notória importação de “estilos” e materiais do estrangeiro, muito por causa da elevada emigração na região. O que resulta, muitas vezes, em habitações com características que estão associadas à génese de outros países, como Suíça e França.

Dentro do que é a arquitetura vernacular, podemos também encontrar um grande recurso à pedra de granito, que facilmente se encontra na região, sobretudo nas zonas das pedreiras. Por vezes, a facilidade de acesso a estes materiais, como é o caso do granito, resulta num uso excessivo e pouco convencional dos materiais.


Que valores arquitetónicos deveríamos preservar e desenvolver para a valorização e promoção do nosso território?

Acho que a preservação do património é extremamente importante e a consciencialização deve começar com ações promovidas pelas escolas e autarquias. Este projeto que está a ser desenvolvido, o Projeto Cultural de Escola, no âmbito do Plano Nacional das Artes, especificamente a ação “As Aldeias da Nossa História”, assim como outros que promovam a região, são essenciais para que as crianças aprendam o que é o património e a sua importância para o território. E quanto mais cedo essa consciencialização começar, mais frutos trará no futuro. Dessa forma, estamos a construir uma sociedade mais sensível e interessada. A participação da comunidade é importante e a promoção do território também deve ser feita a nível local. Incentivar a população a cuidar das suas aldeias e património. Estamos perante uma região com recursos naturais e paisagens únicas e o nosso papel deve passar pela preservação, sem que a construção de novos edifícios seja demasiado impositiva. Quando construímos, estamos também a construir a paisagem. Nunca nos devemos esquecer disso.


Mariana, muito obrigada pelo teu testemunho tão esclarecedor e enriquecedor e pela perspetiva que nos deste sobre a Arquitetura, sobre a sua importância na construção harmoniosa da sociedade, mas também sobre a sua função organizadora e estética, bem como o papel que ela pode desempenhar na construção da paisagem e na afirmação da identidade cultural de um povo ou de uma região.

O concelho de Castro Daire é rico em granito e, em algumas zonas, em xisto; pode-se dizer que tem um caráter arquitetónico que carateriza as construções habitacionais das suas aldeias, quer na forma quer na função. A arquitetura pode exercer um papel muito importante na simbiose entre o uso destas matérias e a construção das habitações. Sem esquecer a relação com a paisagem e o meio que as rodeia.

As nossas aldeias e as suas habitações típicas são uma marca relevante do nosso território e da nossa cultura.

É importante restaurar e manter o património arquitetónico que nos identifica e distingue. Devemos preserva-lo e valoriza-lo para fazer dele a história do nosso futuro. Para construir memórias.

A arquitetura das habitações espelha a arquitetura cultural e social de um povo!

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