"Nas recordações adormecidas das gentes da Serra do Montemuro, acordei esta história, que pertence ao passado e se prolonga no futuro.
Segundo reza a tradição popular, no século XII, primórdios da nacionalidade, Leovigildo Peres, homem de muita fé, escolheu Roriz para seu berço. Roriz, localidade situada no sopé da Serra das Cabaças e da Serra do Cimal, cruzando o olhar com a Serra do Montemuro. Hoje, Reriz é o seu nome.
Leovigildo, homem crente e solitário, resolveu vaguear para sul, à busca de um lugar, onde se ouvissem as penas dos passarinhos e os ovinhos a bulir nos ninhos. Prisioneiro da vida, a oração e a penitência eram seu alimento.
Encostado a um velho pau ressequido pelo tempo e enegrecido pelo uso, caminhou em lugares misteriosos, trilhados por sacrifícios de autêntico heroísmo. O tilintar das espadas usadas pelos homens de cruz ao peito ecoava nos filtros do sol ensanguentado. Os suspiros e os lamentos penduravam-se no crucifixo que trazia ao pescoço. De corpo cansado, mas não resignado, Leovigildo isolou-se nas cercanias de Ourique.
O grito da guerra entre sarracenos e cristãos soava como trovão medonho. O bulício das armas e dos homens avançava em tumulto. D. Afonso Henriques, desesperado, recolheu-se numa tenda e lia o Velho Testamento, à busca de um milagre para vencer os mouros, que pareciam carreiros de formigas. Nestes instantes de recolhimento, foi alertado por um dos seus de que um velhinho lhe queria falar.
Com permissão para entrar, olhou fixamente D. Afonso Henriques. Este, ao ver aquele mensageiro, assustou-se. Era precisamente a personagem com quem minutos antes tinha sonhado e lhe segredou palavras de esperança.
_Que me quereis?- perguntou-lhe.
_Dizer-vos, Senhor, que sois amado por Deus. A Sua Misericórdia está sobre vós. Ide à luta. Ide, pois vencereis. Deus será o vosso guia.
Depois, saiu da tenda para, rapidamente, não mais ser visto.
A batalha travou-se, dura, no Monte das Cabeças. O desbarato dos sarracenos foi total. Cadáveres mouros cobriam os campos da batalha.
Dia 25 de julho de 1139, data que nem os tempos nem os homens apagarão da nossa História. Os cristãos, comandados por D. Afonso Henriques, venceram a batalha. Loucos de alegria pela vitória alcançada, os homens da cruz proclamaram, pela primeira vez, de cabeça erguida aos céus, D. Afonso Henriques como rei.
Leovigildo Peres regressou a Roriz. No Monte das Cabeceiras fundou uma ermida. A ermida de Nossa Senhora da Natividade ou da Nossa Senhora de Rodes..."
In A Alma de um Povo, Celeste Almeida
Celeste Almeida nasceu em Mangualde e reside em Ribolhos, concelho de Castro Daire. Professora do 1º ciclo, aposentada, é escritora, contadora de histórias e colabora na Rádio Limite, com diversos programas culturais, e no jornal Notícias de Castro Daire, com a rubrica Fragmentos de Emoção. É presidente da Associação Flores da Aldeia de Mosteirô, onde lidera um Rancho Folclórico e um grupo de teatro.
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